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Do Exílio para a Universidade

  • Beatriz Clasen e Manuella Mariani
  • 19 de jul. de 2016
  • 3 min de leitura

Trajeto do romance inédito de Jorge Amado até a UFSC

“O relógio discordava dos móveis da sala, antigos e pesados, um relógio pequeno e moderno, presente que Dalva recebera no último aniversário." Assim, começa as primeiras linhas de um romance inédito e inacabado que Jorge Amado escreveu entre 1941 e 1942.

Jorge Amado, o baiano de Itabuna, foi um dos mais famosos e traduzidos escritores brasileiros de todos os tempos. Autor de sucessos como Gabriela, Cravo e Canela, Tieta do Agreste, Dona Flor e seus Dois Maridos e Capitães de Areia, este, que retratava muito a ideologia comunista do autor.

Enquanto Getúlio Vargas, presidente do Brasil na época, mandava queimar todos os livros de simpatizantes comunistas em praça pública, o autor se exilava na Argentina para escrever a biografia de Luís Carlos Prestes, a pedido do Partido Comunista Brasileiro (PCB).

Durante o exílio, Amado viajou pela América Latina e deu início ao seu romance inédito, com dois possíveis títulos: Agonia da Noite ou São Jorge dos Ilhéus, que, mais tarde seriam dados aos dois futuros livros do autor, porém sem relação alguma com o que escreveu no exílio. As 76 páginas narram 12 horas nas vidas de 12 personagens comunistas que, ao redor de um aparelho de rádio, esperam o sinal para o levante.

Por ser considerado “altamente revolucionário”, Jorge Amado, antes de retornar ao Brasil, deixou o manuscrito de 76 páginas, documentos e cartas sob os cuidados de companheiros ideológicos. No total, são mais de 1.400 documentos deixados na mala, que foi passada primeiramente para judia polonesa Rosa Scliar.

A passagem da Mala

Rosa era mãe de duas garotas: Esther e Leonor. Em uma ação de militância pelo Partido Comunista, saiu para distribuir panfletos no Mercado Público de Porto Alegre e foi presa pelos militares. Por não ser brasileira, foi deportada para o Uruguai com o marido e as duas filhas. A família retornou ao Brasil dois anos depois, exceto Rosa. Com seu companheiro de ideologia, Bernardino do Vale, ela se apaixonou e divorciou-se do de Isaac, o pai de suas filhas. Ela e o atual esposo mudaram-se para Montevidéu, onde encontraram Jorge Amado, prestes a voltar ao Brasil.

Dezessete anos depois da prisão da mãe, as duas filhas voltaram a vê-la. Esther se tornou uma grande pianista e compositora. Teve uma vida movimentada, morando em vários lugares do país e do mundo, mas anos mais tarde, suicidou-se. Já Leonor tornou-se linguística, escritora e tradutora. Continuou morando em Porto Alegre e visitando a mãe diversas vezes. Em uma destas visitas, recebeu da mãe a mala que Jorge Amado deixara sob seus cuidados.

Como a mala chegou à UFSC

Leonor tornou-se professora emérita da Universidade Federal de Santa Catarina e atualmente é voluntária no Departamento de Língua e Literatura Vernáculas. Em 2011 decidiu doar a mala à professora Tânia Regina Oliveira Ramos, também professora do departamento de Letras da UFSC e coordenadora do Núcleo Literatura e Memória, o nuLIME. “Eu acredito que estava no lugar certo e na hora certa” se refere Tânia, ao receber a mala de Leonor.

O acervo foi catalogado e digitalizados pelas bolsistas do nuLIME. Thalita Coelho foi responsável pela digitalização do romance e diz que todas as vezes em que leu o romance, encontrou um ponto diferente e interessante. “Fazendo jus à fama de Jorge Amado, apenas meninas se interessaram pelas obras dele, nenhum menino se interessou”, completa a coordenadora Tânia Ramos.

Quando os documentos chegaram as mãos de Tânia, a UFSC orientou a procurar o Conselho de Ética, pois: a mala seria dela ou da família de Jorge Amado? Se Tânia tivesse que devolver a mala, seria para Leonor, pois havia ali a recordação da mãe, Rosa. O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, CNPq legitimou o projeto proposto por Tânia e permitiu que o conteúdo da mala fosse usado para estudo acadêmico.

E assim, a obra inacabada e -por muitos- desconhecida chegou na Universidade, trazendo novos olhares e novas lembranças para quem reconhece o autor. Apesar de tudo, obra não vê futuro para os públicos e livrarias populares, por não ter um final.

Confira a matéria no vídeo abaixo:


 
 
 

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